![Brotos de maconha sentados ao lado de frasco de remédio prescrito](https://mastologistaemsaopaulo.com.br/wp-content/uploads/2025/02/cannabis-medicinal.jpg)
O risco de interação entre a cannabis e os medicamentos para o câncer
Com o aumento dos locais onde o uso medicinal da cannabis é viável e o crescimento das pesquisas científicas sobre o tema, várias dúvidas surgem a respeito de como as substâncias presentes na planta podem ser úteis para lidar com a evolução de um câncer.
Não por menos, evidências mostram que o número de pacientes utilizando derivados da cannabis é cada vez maior. No entanto, tal opção muitas vezes ignora o risco de possíveis interações com os medicamentos para o câncer de mama cujo uso já está estabelecido há mais tempo.
A evolução da prescrição da cannabis com fins terapêuticos
As plantas do gênero cannabis são velhas conhecidas da humanidade. Há séculos, elas são cultivadas e utilizadas para diversos fins, incluindo uma série de possibilidades terapêuticas. Em muitos casos, o potencial disso ainda não é bem compreendido pela medicina, o que pouco a pouco está mudando.
Boa parte desses possíveis efeitos benéficos se dá a partir de duas moléculas presentes na planta: o canabidiol, também conhecido como CBD, e o tetrahidrocanabinol, chamado de THC. Este segundo é o responsável pelo “barato” durante o uso recreativo da maconha, mas também vem apresentando algumas aplicações, como o combate a quadros de dor e insônia.
De qualquer forma, embora o uso desses elementos venha sendo liberado em várias localidades mundo afora, as regras ainda são bem restritas. No Brasil, por exemplo, a comercialização de preparados farmacêuticos à base de cannabis foi autorizada apenas em 2019. O processo exige receituário especial com a devida retenção de receita, entre outros requisitos.
O uso de cannabis por pacientes com câncer de mama
Diante de todas as evidências, em determinados contextos pacientes com câncer de mama parecem estar explorando os potenciais da planta e seus derivados para gerenciar sintomas das neoplasias, bem como efeitos colaterais do tratamento.
Exemplo disso está em um estudo publicado em 2022, que coletou dados junto a pacientes que haviam sido diagnosticados com câncer de mama nos últimos cinco anos. Do total de 612 participantes, 42% (257) relataram ter usado a cannabis para lidar com determinados desconfortos. Entre eles estavam:
- dores (78%);
- insônia (70%);
- ansiedade (57%);
- estresse (51%);
- náuseas e vômitos (46%).
Do total dos entrevistados, 79% usaram a planta em conjunto com tratamentos sistêmicos (quimioterapia, hormonioterapia etc.), radioterapia ou cirurgia para combater o tumor. Contudo, apenas 39% relataram isso a seus médicos.
As possibilidades de interações da cannabis com os medicamentos para câncer
O uso da cannabis (ou de qualquer outro medicamento, substância ou suplemento) durante e depois do tratamento de um câncer de mama apresenta riscos.
Ainda que possam existir alguns benefícios, o que predomina são as lacunas no conhecimento disponível. As mais relevantes incluem:
- interações com outros medicamentos, incluindo aqueles utilizados para combater o tumor;
- falta de dados que possam antever combinações indevidas da cannabis com outras substâncias;
- ausência de informações sobre o impacto dessas abordagens no longo prazo.
Para tentar melhorar o grau de evidências sobre o tema, um trabalho abordando a questão foi apresentado na edição de 2024 da Sociedade Norte-Americana de Oncologia Clínica (Asco).
No estudo, pesquisadores norte-americanos entrevistaram indivíduos tratando um câncer (15% do total dos casos era de neoplasias na mama) para coletar informações sobre quais medicamentos eles estavam utilizando. No total, 318 pessoas responderam um questionário sobre o tema.
Desse montante, 61 (pouco menos de 20%) relataram estar utilizando a cannabis no momento das perguntas. A partir disso, um software analisou as respostas para cruzar os dados e identificar potenciais interações medicamentosas. Ao todo, foram mapeadas 412 possibilidades:
- em 71% das interações medicamentosas com cannabis foram com medicamentos para outras condições que não o câncer;
- 17% das internações elas aconteceram com medicamentos de venda livre.
- 10% estavam relacionadas justamente com agentes anticâncer.
Adicionalmente, a análise identificou várias interações medicamentosas de gravidade moderada, com destaque para o paracetamol (acetaminofeno), em 9,5% dos episódios, a dexametasona, em 8%, e a ondansetrona, em 6,3%.
Com relação aos componentes quimioterápicos, o maior potencial de risco envolvia o paclitaxel (4%) e a doxorrubicina (2%).
Logo, esses resultados destacam que se a cannabis é frequentemente utilizada por pacientes com câncer para aliviar sintomas, é indispensável levar em conta a suas possíveis interações com outros medicamentos e como isso pode alterar a eficácia dos tratamentos ou aumentar o risco de efeitos adversos.
Leia também: Os benefícios da meditação para pacientes diagnosticadas com câncer de mama
O que médicos e pacientes precisam levar em conta no uso desse recurso
Acima de tudo, quem cogita ou já usa a cannabis e seus derivados depois de um diagnóstico de câncer de mama deve ter ciência de que nenhum componente presente na planta é capaz de curar a doença, nem substituir tratamentos convencionais.
Além disso, é fundamental ser transparente sobre o uso da alternativa junto aos profissionais de saúde responsáveis pelo acompanhamento do quadro. São eles que vão orientar sobre os riscos e os benefícios dessa opção, bem como identificar possíveis interações com os medicamentos para o câncer.
Adicionalmente, cabe sempre ressaltar que as evidências sobre como a cannabis pode ajudar na jornada do paciente diagnosticado com um tumor ainda são pequenas. A maioria delas restringe as possibilidades ao controle de enjoos e vômitos desencadeados pelos medicamentos empregados na quimioterapia.
Por falar nisso, aproveite para saber mais sobre o que é possível esperar dos efeitos colaterais após a primeira sessão de quimioterapia.