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Mão com luva segurando implante conhecido como implante da beleza

Uso de “chip da beleza”: as reais aplicações e os possíveis riscos para a saúde

Já em destaque na mídia há algum tempo, o dispositivo que ficou conhecido como “chip da beleza” voltou a chamar atenção no final de 2024. Isso aconteceu em virtude do aumento das restrições impostas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A entidade reguladora estabeleceu medidas rigorosas para combater o uso irregular desses implantes hormonais manipulados devido aos relatos frequentes de complicações associadas, conforme alertado por diversas entidades médicas em todo o país.

Afinal, como e por que os chips de beleza ganharam tanta popularidade?

O que vem sendo chamado de chip da beleza não tem necessariamente relação com qualquer inovação tecnológica do mundo da informática ou dos cosméticos.

Na prática, os chamados “chips da beleza” são implantes hormonais feitos de silicone colocados abaixo da pele, próximo à camada de gordura, em regiões como glúteos, braços ou abdômen.

Geralmente, eles combinam de maneira inadequada mais de um hormônio ou substância química (incluindo estosterona, gestrinona, ciproterona, oxandrolona, progesterona, ocitocina, NADH, entre outras),cuja composição específica é supostamente alinhada às necessidades individuais.

Esses implantes hormonais, que são utilizados há várias décadas, prometem soluções para problemas estéticos e hormonais, mas carecem de evidências robustas obtidas com estudos de Nível I e Nível II que comprovem sua segurança e eficiência.

O que existem são apenas alguns estudos descritivos associados a vieses que comprometem a validade dos resultados apresentados.

Não por menos, publicação na Endocrine News alerta justamente para os riscos associados a essas terapias manipuladas, apontando a falta de evidências robustas e destacando o uso inadequado desses tratamentos em busca de soluções milagrosas.

As promessas, indevidas, sustentam que tais recursos auxiliam no aumento de massa muscular, perda de peso, combate ao envelhecimento e elevação da capacidade sexual, entre várias afirmações sem qualquer respaldo.

Outro fator que contribuiu com a popularização do tema é a abordagem agressiva, sobretudo nas redes sociais.

Apesar de proibida qualquer apologia e prescrição de hormônios para fins estéticos e de aprimoramento de performance, essa divulgação envolve quase sempre profissionais de saúde sem a devida qualificação (médicos sem especialidade cadastrada ou mesmo biomédicos e farmacêuticos), junto de custos muito elevados.

Por que o uso desse dispositivo pode ser tão arriscado para a saúde?

Salvo raras exceções, nenhum desses dispositivos possui registro para comercialização adequada junto às autoridades competentes, no Brasil e no mundo. Como todo medicamento ou intervenção similar, eles dependem da apresentação de dados de eficácia e segurança para uma liberação apropriada.

Porém, a restrição aos chips da beleza não tem relação com outras aplicações legítimas de diferentes formas certificadas de reposição hormonal.

Há algumas décadas, mulheres na menopausa se beneficiam do uso controlado dessas substâncias, sempre com supervisão profissional qualificada (de um ginecologista ou endocrinologista capazes de seguir as regras estabelecidas, por exemplo).

Além disso, implantes hormonais corretamente desenvolvidos podem ser utilizados como método anticoncepcional. Adicionalmente, eles podem ser usados no tratamento da endometriose e, mais raramente, como estratégia de reposição hormonal durante a menopausa.

Já o uso irregular aumenta a chance de ameaças à saúde. A distribuição de hormônios muitas vezes aleatória e sem qualquer controle de segurança e eficácia, pode trazer consequências indesejadas, como:

  • Alterações metabólicas.
  • Disfunções cardiológicas.
  • Aumento do risco de episódios trombóticos e acidentes vasculares.
  • Danos hepáticos e renais.
  • Prejuízos ao sistema reprodutivo de homens e mulheres.

Além disso, estudos indicam que a manipulação inadequada de hormônios em doses não padronizadas pode exacerbar determinados desarranjos metabólicos, incluindo problemas relacionados ao colesterol, triglicérides e resistência à insulina. Logo, isso reforçar a necessidade de práticas baseadas em evidências para minimizar impactos adversos à saúde.

A falta de evidências que confirme os benefícios dos chips da beleza

Mesmo os possíveis benefícios associados a essa técnica provêm de estudos de baixíssima qualidade. Um artigo que alega que o uso de hormônios como testosterona e estradiol provocou poucos eventos adversos, na verdade, apresenta inconformidades significativas.

Publicado na revista Therapeutic Advances in Endocrinology and Metabolism, o estudo baseia-se em dados coletados pelo aplicativo do próprio fabricante, limitando a validade científica do artigo e apresentando vieses importantes.

Os dados coletados em uma coorte longitudinal retrospectiva não comparativa incluiu informações de 307.690 mulheres. Os autores alegaram que realizaram mais de 1 milhão de implantes, mas deixaram de avaliar questões importantes como acne, hirsutismo (aumento de pelos corporais), alopecia (queda de cabelo) e efeitos metabólicos.

Além disso, 43% ds pacientes descontinuaram o uso e não foram analisados, enquanto a taxa de satisfação de 93% foi restrita apenas ao segundo implante.

Os dados de segurança foram limitados aos usuários de mais de um implante. Por fim, o estudo parece ter distorcido o número de complicações ao limitar a consideração de eventos adversos de acordo com os interesses do fabricante.

Portanto, não há a robustez ou credibilidade necessárias para embasar qualquer afirmação positiva em torno da segurança e da eficácia da intervenção.

O que é possível afirmar sobre a relação entre o uso do chip da beleza e o câncer de mama?

A Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) e a Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica divulgaram notas reforçando os riscos dessa modalidade de implante hormonal manipulado.

O teor do comunicado considerou a influência na probabilidade de desenvolvimento de câncer, inclusive nas mamas.

A FEBRASGO, inclusive, enfatiza o lema: “Terapia hormonal SIM. Com ética e segurança SEMPRE.”

A campanha reforça que esse recurso abrange tratamentos para várias condições de saúde, incluindo a reposição hormonal na menopausa, mas que deve sempre ser conduzida com métodos comprovadamente seguros.

Atualmente, apenas o Implanon é aprovado pela regulamentação brasileira como implante anticoncepcional, destinado exclusivamente à prevenção da gravidez.

Além dos aspectos já mencionados (ausência de registro pela Anvisa, controle das substâncias e compreensão de sua ação no corpo), a entidade destaca que a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que determinados hormônios (sobretudo os esteroides androgênicos e anabolizantes) são potencialmente cancerígenos.

É preciso ainda considerar os perigos aos quais pacientes diagnosticadas com câncer de mama durante o uso desses dispositivos estão submetidas. Como a remoção total do chip é complicada, a elevação do nível hormonal se mantém por um longo período e influencia na disseminação das células cancerígenas, prejudicando o sucesso dos tratamentos disponíveis.

Em resumo, ainda que preocupações estéticas e de bem-estar sejam relevantes, elas devem ser tratadas sempre com a supervisão de profissionais responsáveis, capazes de oferecer alternativas devidamente respaldadas pela melhor ciência disponível.

Se você está considerando o uso de implantes hormonais, busque orientação de i, profissional de saúde qualificado e priorize tratamentos baseados em evidências científicas.

Para informações de qualidade sobre câncer de mama e saúde da mulher, acesse sempre o nosso blog, que traz atualizações constantes sobre esse e outros temas.

Médica mastologista especializada em reconstrução mamária. Além de sua prática clínica, Dra. Brenda atua como mastologista no Hospital Alemão Oswaldo Cruz, é preceptora da residência médica de Mastologia na Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP) e membro titular da Sociedade Brasileira de Mastologia. | CRM-SP 167879 / RQE – SP Cirurgia Geral: 81740 / RQE – SP Mastologia: 81741

ps.in@hotmail.com

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