É possível interromper a hormonioterapia com segurança para engravidar? Veja novidades sobre isso
Novo estudo indica que interromper a hormonioterapia para tentar engravidar não aumenta o risco de que o câncer de mama volte
O diagnóstico de um câncer de mama em mulheres em idade fértil pode gerar uma angústia ainda maior para quem deseja ter um filho. Embora o tema já seja bastante discutido, uma novidade pode oferecer maior segurança a essas pacientes em determinados casos: interromper a hormonioterapia para tentar uma gestação não oferece riscos adicionais de recidiva da doença.
Essas foram as conclusões de um estudo publicado em maio de 2023, no New England Journal of Medicine. A notícia é boa porque contribui para reduzir o estresse e o desconforto que incertezas do tipo podem gerar em pacientes jovens que pretendiam engravidar.
As restrições para uma gestação durante a hormonioterapia
A hormonioterapia envolve a administração de certos fármacos para bloquear a produção de determinados hormônios dentro do organismo ou impedir que eles atuem sobre o desenvolvimento das células cancerígenas. Por isso, ela é indicada apenas para os casos em que o tumor é receptor hormonal positivo.
Além disso, a hormonioterapia pode ser prescrita antes da cirurgia (ou seja, de forma neoadjuvante) ou depois da cirurgia (como tratamento adjuvante), para reduzir o risco de recidivas. Esse tipo de terapia também é um recurso profilático importante em mulheres com alto risco de desenvolver um câncer de mama.
Entretanto, é preciso levar em conta que o tratamento deve ser mantido por períodos que variam entre 5 e 10 anos. Durante o tratamento, a mulher pode perceber efeitos colaterais, incluindo prejuízos à fertilidade. A supressão da atividade de determinados hormônios afeta o ciclo de liberação dos óvulos, por exemplo.
A paciente ainda tem chance de engravidar, embora não seja recomendado que mulheres recebendo hormonioterapia comecem uma gestação. A medicação pode oferecer riscos à formação do feto. Por outro lado, não há evidências de que uma gestação posterior aumenta o risco de que a doença volte no futuro.
Seja como for, levando em conta a idade do diagnóstico e o período necessário para o tratamento, pode haver a preocupação sobre a capacidade da mulher engravidar no futuro. Não é incomum, por exemplo, que essas pacientes terminem a hormonioterapia já em um período de declínio natural da fertilidade.
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A possibilidade de interromper a hormonioterapia para engravidar
Foi diante desse quadro que o estudo POSITIVE (acrônimo em inglês para “resultado da gravidez e segurança da interrupção da terapia endócrina para mulheres com câncer de mama”) foi desenhado. Os responsáveis pela investigação queriam saber se é seguro interromper a hormonioterapia para tentar engravidar.
Para isso, foram reunidas mulheres abaixo dos 42 anos que estavam recebendo terapia hormonal por períodos entre 18 e 30 meses. Todas elas, claro, tinham o desejo de engravidar. Ao todo, foram recrutadas 514 pacientes, com idade média de 37 anos. Elas haviam sido diagnosticadas com câncer de mama, em média, há pelo menos 29 meses. Não havia restrição sobre o uso anterior de quimioterapia
A partir disso, as pacientes interromperam a hormonioterapia. Primeiro, houve um período de 3 meses chamado de “washout” para eliminar o risco de interferência da hormonioterapia na gravidez. Em seguida, as pacientes tiveram até 2 anos de suspensão no tratamento para tentar engravidar. Esse período incluía a concepção, a gestação, o parto e a amamentação. Finalizado esse período, a hormonioterapia poderia ser retomada.
Com a interrupção do tratamento em curso, os pesquisadores acompanharam o número de casos de recidiva do câncer de mama e indicadores relacionados à fertilidade (ou seja, número de gestações, de bebês nascidos vivos, segurança da amamentação, entre outros). Dentro desse período, se mais de 46 mulheres apresentassem um evento de recidiva, o estudo seria interrompido.
As conclusões do estudo e a segurança da interrupção do tratamento
Durante o período de acompanhamento, 44 pacientes apresentaram algum tipo de recorrência do câncer de mama. Ou seja, o patamar de episódios negativos foi menor do que o limite estabelecido. Outro dado relevante mostra que a taxa de incidência de recidivas foi 8,9% entre as pacientes acompanhadas, contra 9,2% na coorte populacional usada como referência.
Portanto, os números apontaram para uma incidência parecida do que seria observada se o tratamento fosse mantido. Logo, na prática, isso significa que parece não haver implicações para a segurança devido à interrupção do tratamento endócrino em pacientes dentro do perfil analisado.
Além disso, 368 pacientes (quase 75% das pacientes sem recidiva) engravidaram ao menos uma vez durante o período do estudo. Nesse recorte, 215 mulheres indicaram o uso técnicas de reprodução assistida. No mais, ao final do acompanhamento, 350 gestações haviam gerado 365 bebês nascidos vivos. Após o fim da coleta de dados, 304 mulheres retomaram a hormonioterapia. Dentre o grupo que ainda não havia retomado, parte continuava tentando engravidar ou estava amamentando.
Entretanto, o estudo reforça a necessidade de que essas pacientes sejam acompanhadas no longo prazo (acima dos 3 anos). Por fim, vale reforçar que a decisão de interromper a hormonioterapia deve passar por uma conversa com o médico responsável, que também pode sugerir recursos para preservação da fertilidade (como o congelamento de óvulos para posterior fertilização, por exemplo).
Para saber mais sobre as possibilidades e cuidados para uma gravidez pós câncer de mama, confira esse conteúdo já publicado aqui no blog.